Entre as frases mais duras que ouvimos em atendimentos com acusados e familiares está esta: “O advogado não me escuta.” Não é uma questão de má vontade. Em muitos casos, trata-se de falta de tempo, excesso de processos, distanciamento técnico ou mesmo despreparo para lidar com casos que envolvem complexidade emocional, vínculos familiares, risco de julgamento injusto e necessidade de escuta ativa.
Neste post, falamos diretamente com quem está se sentindo silenciado, ignorado ou marginalizado pela própria defesa. Especialmente em processos de homicídio, tentativa de homicídio, infanticídio ou induzimento ao suicídio, ser ouvido é mais do que um gesto de respeito: é um elemento essencial da estratégia jurídica. A defesa técnica não se constrói só com códigos e petições, mas também com escuta real e tradução jurídica da verdade do acusado.
O QUE SIGNIFICA NÃO SER ESCUTADO PELA SUA DEFESA
Não ser escutado não é apenas não ser atendido ao telefone. É quando o advogado não pergunta como o fato aconteceu, não quer saber o que você tem a dizer sobre as testemunhas, ignora provas que você tem condições de oferecer ou desconsidera aspectos importantes da sua história de vida que poderiam ser usados na sua defesa.
Muitos réus dizem: “eu queria explicar, mas ele não quis ouvir.”
Ou: “quando tentei contar, ele cortou e disse que não importava.”
Ou ainda: “ele disse que não adianta, que é melhor confessar logo.”
Esse tipo de atitude fere o direito à ampla defesa. E, pior: compromete a construção da linha argumentativa, pois decisões técnicas são tomadas sem conhecer a versão da pessoa que será julgada.
Importante: advogado não é obrigado a seguir tudo que o réu diz. Mas ele é obrigado a escutar com atenção, discernir o que é útil juridicamente, explicar os limites e construir a tese com base em diálogo. Sem isso, o risco é alto: a defesa se torna genérica, incoerente ou até contrária ao que o réu gostaria de sustentar.
QUANDO O PROBLEMA É DE POSTURA E QUANDO É DE ESTRATÉGIA
Nem todo silêncio do advogado é desrespeito. Às vezes, o defensor está formulando estratégia e ainda não pode revelar detalhes. Mas há sinais que indicam um problema real de relação ou abandono:
- O advogado nunca ouviu a versão do fato diretamente do acusado;
- Ignora pedidos reiterados de informação;
- Desconsidera testemunhas indicadas pela família;
- Não responde cartas ou recados de quem está preso;
- Faz afirmações como “isso não interessa” sem justificar juridicamente.
Se isso está acontecendo, não é só uma falha de comunicação. É uma falha de defesa. O processo penal exige participação do réu e da família no esclarecimento da verdade dos fatos. Quando o advogado exclui essa participação, compromete a qualidade da estratégia.
COMO REAGIR QUANDO SUA DEFESA NÃO TE OUVE
Existem caminhos para enfrentar essa situação com seriedade e legalidade:
- Tente registrar o que está ocorrendo. Guarde mensagens, anote datas em que tentou contato, o que foi dito e como foi tratado.
- Solicite formalmente um encontro para falar sobre a estratégia de defesa. Pode ser por carta, e-mail ou por meio da família.
- Peça, com educação, que o advogado explique a linha que está sendo adotada e por que determinada informação foi ignorada.
- Se não houver resposta ou se houver recusa reiterada em escutar, avalie a substituição do defensor.
A troca de advogado pode ser feita em qualquer fase do processo. Inclusive, é possível pedir ao juiz o adiamento de audiência ou do júri para que a nova defesa tenha tempo de se preparar.
Em casos graves, como omissão completa de contato, ausência de sustentações orais ou defesa claramente contrária aos interesses do réu, pode haver fundamento para requerer nulidade do processo.
O VALOR PROBATÓRIO DA ESCUTA NA ESTRATÉGIA DE DEFESA
A escuta não é só afeto. É prova. Muitas informações que o acusado ou a família têm não estão nos autos. São elas que podem revelar:
- Onde ele estava na hora do crime;
- Por que determinadas testemunhas mentem;
- Qual é o contexto do vínculo com a vítima;
- Se houve provocação, legítima defesa, omissão ou mero envolvimento lateral;
- Se há histórico de perseguição ou armação;
- Se existem provas esquecidas, registros de GPS, câmeras ou mensagens antigas.
Tudo isso pode ser perdido se o advogado não se dispõe a ouvir. E uma tese construída sem a verdade do réu é uma defesa de papel, não de vida.
PERGUNTAS FREQUENTES
Posso pedir que o advogado me escute antes de ele tomar decisões?
Sim. O Código de Ética da OAB impõe o dever de diálogo, informação e respeito à autonomia do cliente.
O advogado pode recusar minha versão do fato?
Ele pode não adotá-la juridicamente, mas deve escutá-la, ponderar e explicar a decisão. A imposição unilateral sem escuta fere a boa prática profissional.
Se eu estou preso e ele não me visita, o que posso fazer?
Você pode escrever uma carta para o juiz do caso informando a ausência de contato, e pedir providências. Também pode pedir ajuda da família para nomear outro defensor.
Trocar de advogado pode prejudicar o processo?
Se for feito com estratégia, não. Pode inclusive salvar o processo se o antigo defensor estiver omitindo provas ou praticando atos contrários ao interesse do réu.
O juiz pode nomear um defensor público se o advogado não me escuta?
Em casos graves de abandono técnico, sim. Mas o ideal é que o réu ou a família tome a iniciativa e substitua a defesa antes que o prejuízo seja irreversível.
QUEM VAI SER JULGADO TEM O DIREITO DE SER ESCUTADO
A justiça não pode funcionar em silêncio. E uma defesa verdadeira começa pela escuta. Quando o advogado não quer saber da sua história, ignora suas dúvidas ou desconsidera suas provas, o que está em risco não é só o resultado do processo. É sua dignidade como pessoa.
Na Almeida Marques Advocacia, entendemos que escutar é parte da técnica. O que você viveu importa. O que você lembra importa. O que você sente importa. E é disso que nasce uma defesa forte, humana e juridicamente sólida.
Se você está sendo acusado de um crime doloso contra a vida e sente que não está sendo escutado, ainda há tempo. Trocar de defesa pode ser difícil, mas continuar sem ser ouvido é muito mais arriscado.
Agende uma conversa. Conte sua história. Estamos aqui para escutar — com estratégia, compromisso e respeito.